segunda-feira, 25 de abril de 2011

Argentina julga acusados por crimes contra 181 presos políticos na ditadura

24/11/2009 - 19h14
folha.uol.com

da Folha Online
 
Quinze repressores argentinos começaram a ser julgados nesta terça-feira por graves violações aos direitos humanos cometidas contra 181 presos políticos, levados a três centros ilegais de detenção de Buenos Aires durante a última ditadura no país (1976-83).

Estão sendo acusados militares e policiais que agiram nos centros de torturas Club Atlético, El Banco e El Olimpo, sob a jurisdição do então Primeiro Corpo do Exército, a maior unidade militar argentina, que abrangia a capital e a província de Buenos Aires, a zona urbana mais povoada do país.

Entre os réus está o ex-policial Julio Simón, conhecido como "Turco Julían", que em 2006 foi condenado a 25 anos de prisão pelo desaparecimento em 1978 de um casal composto por um chileno e uma argentina, que foi a primeira condenação no país após a anulação das "leis do perdão".

O julgamento precede em quase três semanas o processo contra os repressores que atuaram na Escola de Mecânica da Armada (ESMA), também localizada em Buenos Aires, e que foi considerada o centro de torturas emblemático do regime militar, para onde foram levados 5.000 prisioneiros, a maioria desaparecidos.

"Bem-vindos ao olimpo dos deuses", dizia um cartaz na entrada de El Olimpo, por onde, estima-se, tenham passado 1.500 prisioneiros.

O processo tentará demonstrar que existiu "um plano criminoso global" contra os opositores durante a ditadura, segundo os denunciantes.

Os 15 acusados, entre eles dez policiais e cinco militares, entraram algemados e escoltados na sala de audiências do Tribunal Federal Oral 2 e se sentaram em duas fileiras em total silêncio, perto de onde estavam os que entraram com a queixa, vários deles filhos de desaparecidos.

Repressão
Segundo números oficiais, 18 mil pessoas desapareceram na Argentina durante o regime militar, embora organismos de direitos humanos afirmem que as vítimas chegam a 30 mil. Organizações de direitos humanos estimam ainda que 500 bebês nascidos durante o cativeiro de suas mães foram roubados, dos quais 97 recuperaram a verdadeira identidade.
A ditadura no país aconteceu em uma época em que a maioria dos países da América do Sul caíram sob regimes autoritários, em conflito com grupos de esquerda, no âmbito da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética.
Na Argentina há 204 causas abertas por violações aos direitos humanos durante a ditadura, nas quais estão sendo julgados 526 repressores, dos quais 385 se encontram detidos, segundo um recente levantamento do Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS).
Os julgamentos dos acusados de crimes durante a ditadura argentina foram retomados depois da revogação, em 2005, das "leis do perdão" -- Ponto Final e Obediência Devida-- aprovadas em 1986 e 1987, e que foram consideradas inconstitucionais pela Suprema Corte.
Vários oficiais da ditadura foram condenados a penas de prisão perpétua após a retomada dos julgamentos referentes ao período. Em julho de 2008, o ex-comandante Luciano Menéndez foi condenado a passar a vida na prisão por crimes cometidos em La Perla, um dos três maiores campos clandestinos de detenção da ditadura do país.
Quatro meses depois, o coronel da reserva Alberto Barda recebeu a mesma pena por crimes de lesa-humanidade cometidos no centro clandestino de detenção conhecido como La Cueva, na cidade de Mar del Plata, a 400 km ao sul da capital argentina.
No último dia 12 de agosto, o ex-general Santiago Omar Riveros, 86, ex-comandante do Campo de Mayo, foi condenado à prisão perpétua por crimes de lesa-humanidade, por implicação no assassinato de Floreal Avellaneda, de 15 anos, filho de um militante comunista, e pelo sequestro da mãe do jovem, Iris Avellaneda.
Também está preso o ex-ditador Jorge Videla, 84, que presidiu a junta militar desde o golpe de Estado, em 1976, até 1981. Em agosto passado, a Justiça informou que ele voltará ao banco dos réus devido a uma acusação pelas mortes de 32 presos políticos na Província de Córdoba em 1976. Será a primeira vez desde 1985 que o ex-ditador voltará a enfrentar um tribunal em um julgamento oral, ainda sem data, embora pesem sobre ele dezenas de acusações por violações dos direitos humanos.
No julgamento anterior, Videla foi condenado à prisão perpétua, mas acabou indultado em 1990 pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-99). Esse perdão foi anulado em 2007 pela Justiça.
No Uruguai, onde o número estimado de vítimas é de cerca de 200, a Justiça condenou em outubro o ex-ditador Gregorio Goyo Álvarez a 25 anos de prisão pelo "homicídio especialmente agravado" de 37 opositores e por um delito de lesa-humanidade. Os casos foram reabertos no país a partir de brechas na lei, mas a população rejeitou em referendo no mês passado a revogação da lei de anistia.
No Brasil, onde o governo reconhece que houve ao menos 475 mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura, a Lei de Anistia impede processos contra os agentes do Estado envolvidos em tortura e assassinato durante o regime militar e contra os membros de grupos armados da oposição esquerdista que praticaram sequestros e assassinatos politicamente motivados durante o período.
Diante da pressão de grupos de direitos humanos brasileiros e de membros do governo, como o ministro Paulo Vannucchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, para a reabertura dos casos e a revisão da Lei de Anistia, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse, em junho, que a ideia de punir militares por atos de tortura cometidos durante a ditadura militar é "revanchismo".

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