da Folha Online
Um tribunal argentino condenou nesta sexta-feira à prisão perpétua o ex-general Jorge Olivera Róvere por crimes contra a humanidade cometidos durante a última ditadura do país (1976-1983), depois de um processo considerado um dos mais importantes dos últimos 25 anos no país.A Corte condenou também à mesma pena o coronel da reserva Bernardo Menéndez e absolveu os ex-militares Felipe Alespeiti, Humberto Lobaiza e Teófilo Saá.
Róvere, de 82 anos, era o braço direito de Carlos Suárez Mason, um dos símbolos da ditadura, e os outros antigos militares eram julgados desde fevereiro passado por mais de 120 casos de sequestro e desaparecimento.
Só nove das vítimas sobreviveram. Entre os mortos estão o escritor argentino Haroldo Conti, os parlamentares uruguaios Zelmar Michelini e Héctor Rodríguez Ruiz, e os guerrilheiros tupamaros Rosario Barredo e William Whitelaw.
O advogado Luis Bonomi, da acusação, criticou a decisão dos juízes por terem absolvido três militares e por permitirem que os dois condenados permaneçam em liberdade até que a sentença seja ratificada por uma corte superior.
Antes de ouvir o veredicto, Róvere, que chegou ao julgamento em liberdade, disse não ter dado ordens que infringissem os direitos humanos e considerou que houve um "exagero traiçoeiro" da repressão, que, segundo números não oficiais, deixou 30 mil desaparecidos.
O promotor federal Félix Crous tinha pedido prisão perpétua para Róvere e Menéndez, e 25 anos de prisão para outros três envolvidos.
A audiência final foi acompanhada por vários parentes dos acusados e membros de organismos humanitários, que reagiram com indignação ao ouvirem a sentença.
Os julgamentos dos acusados de crimes durante a ditadura argentina foram retomados depois da revogação, em 2005, das "leis do perdão" -- Ponto Final e Obediência Devida-- aprovadas em 1986 e 1987, e que foram consideradas inconstitucionais pela Suprema Corte.
Vários oficiais da ditadura foram condenados a penas de prisão perpétua após a retomada dos julgamentos referentes ao período. Em julho de 2008, o ex-comandante Luciano Menéndez foi condenado a passar a vida na prisão por crimes cometidos em La Perla, um dos três maiores campos clandestinos de detenção da ditadura do país.
Quatro meses depois, o coronel da reserva Alberto Barda recebeu a mesma pena por crimes de lesa-humanidade cometidos no centro clandestino de detenção conhecido como La Cueva, na cidade de Mar del Plata, a 400 km ao sul da capital argentina.
No último dia 12 de agosto, o ex-general Santiago Omar Riveros, 86, ex-comandante do Campo de Mayo, foi condenado à prisão perpétua por crimes de lesa-humanidade, por implicação no assassinato de Floreal Avellaneda, de 15 anos, filho de um militante comunista, e pelo sequestro da mãe do jovem, Iris Avellaneda.
Também está preso o ex-ditador Jorge Videla, 84, que presidiu a junta militar desde o golpe de Estado, em 1976, até 1981. Em agosto passado, a Justiça informou que ele voltará ao banco dos réus devido a uma acusação pelas mortes de 32 presos políticos na Província de Córdoba em 1976. Será a primeira vez desde 1985 que o ex-ditador voltará a enfrentar um tribunal em um julgamento oral, ainda sem data, embora pesem sobre ele dezenas de acusações por violações dos direitos humanos.
No julgamento anterior, Videla foi condenado à prisão perpétua, mas acabou indultado em 1990 pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-99). Esse perdão foi anulado em 2007 pela Justiça.
Repressão
Segundo números oficiais, 18 mil pessoas desapareceram na Argentina durante o regime militar, embora organismos de direitos humanos afirmem que as vítimas chegam a 30 mil. A ditadura no país aconteceu em uma época em que a maioria dos países da América do Sul caíram sob regimes autoritários, em conflito com grupos de esquerda, no âmbito da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética.
No Uruguai, onde o número estimado de vítimas é de cerca de 200, a Justiça condenou nesta quinta-feira (22) o ex-ditador Gregorio Goyo Álvarez a 25 anos de prisão pelo "homicídio especialmente agravado" de 37 opositores e por um delito de lesa-humanidade.
Comandante-em-chefe do Exército, em 1978, e último presidente do regime militar entre 1981 e 1985, Gregorio Alvarez já havia sido julgado anteriormente por outros crimes, tendo recebido uma condenação à prisão, no dia 17 de dezembro de 2007 por desaparecimentos forçados de presos políticos, executados depois de uma série de traslados clandestinos de Buenos Aires a Montevidéu, em 1978.
A lei de anistia do Uruguai, de 1986, respeitada com rigor pelos governos anteriores, foi flexibilizada pelo atual presidente do Uruguai, o socialista Tabaré Vázquez, que adotou brechas legais para deixar de fora do perdão alguns dos mais famosos casos de violações de direitos humanos do país, mas sem chegar a promover a anulação da norma.
No próximo domingo (25), os eleitores uruguaios vão votar, juntamente com a eleição presidencial, em um referendo sobre a possível revogação da lei de anistia do país.
No Brasil, onde o governo reconhece que houve ao menos 475 mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura, a Lei de Anistia impede processos contra os agentes do Estado envolvidos em tortura e assassinato durante o regime militar e contra os membros de grupos armados da oposição esquerdista que praticaram sequestros e assassinatos politicamente motivados durante o período.
Diante da pressão de grupos de direitos humanos brasileiros e de membros do governo, como o ministro Paulo Vannucchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, para a reabertura dos casos e a revisão da Lei de Anistia, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse, em junho, que a ideia de punir militares por atos de tortura cometidos durante a ditadura militar é "revanchismo".
Com France Presse e Efe
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