quarta-feira, 18 de abril de 2012

Bergoglio - A "operação conclave" de Bergoglio

Fonte: Unisinos.

12 de Abril de 2010

Quando a publicação mais importante da Alemanha, a revista Der Spiegel, se refere ao "papado falido" do seu compatriota Joseph Ratzinger (o mesmo termo que a Inteligência norte-americana aplica aos Estados com vazio de poder nos quais justifica sua intervenção), o primaz da Argentina e arcebispo de Buenos Aires, cardeal Jorge Bergoglio (foto), empreende uma operação de lavagem de sua imagem com a publicação de um livro autobiográfico.

O ostensivo propósito de "El Jesuita", como o livro é intitulado, é defender seu desempenho como provincial da Companhia de Jesus entre 1973 e 1979, manchado pelas denúncias dos sacerdotes Orlando Yorio e Francisco Jalics, que ele entregou aos militares. Ambos foram sequestrados cinco meses a partir de maio de 1976. Em troca, as quatro catequistas e dois de seus esposos sequestrados dentro da mesma operação nunca reapareceram. Entre eles, estavam Mónica Candelaria Mignone, filha do fundador do CELS (Centro de Estudos Legais e Sociais), Emilio Mignone, e María Marta Vázquez Ocampo, da presidente das Mães da Praça de Maio, Martha Ocampo de Vázquez.

A reportagem é de Horacio Verbitsky, publicada no jornal Página/12, 10-04-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Ratzinger tem 83 anos e, segundo a Der Spiegel, muitas vozes pedem a sua renúncia. O sacerdote Paolo Farinella escreveu na prestigiosa revista italiana de filosofia MicroMega, cujo diretor Paolo Flores D’Arcais participou de debates públicos sobre filosofia com o Papa, que Bento XVI deveria pedir perdão aos crentes afetados pela restrição do celibato, pelas condições nos seminários e pelos milhares de casos de abusos de crianças e dizer-lhes: "Vou me retirar para um monastério e passarei o resto dos meus dias fazendo penitência pelo meu fracasso como sacerdote e como Papa".

Ninguém se surpreenderia se, depois de beber uma tisana noturna falhasse o coração de um homem entristecido e angustiado por causa das injustas críticas que atingem seu desempenho como bispo da Baviera e não perdoam nem seu amado irmão Georg. A revista alemã menciona o antecedente de Celestino V, um Papa do século XIII, que renunciou porque não se sentiu capaz de cumprir com suas funções.

Se algo disso ocorrer, Bergoglio precisa de uma folha de serviços limpa. Diante de uma pergunta sobre o Papa ideal, o presidente da Associação Alemã da Juventude Católica, Dirk Tänzler, disse à Der Spiegel que preferiria que o escolhido tivesse trabalhado em uma parte pobre da América do Sul ou em outra região atingida pela pobreza, já que teria uma visão diferente do mundo. A compaixão pela pobreza, compartilhada com a Sociedade Rural e a Associação Empresarial AEA, é o nicho de oportunidade escolhido pelo episcopado sob a condução de Bergoglio.

O Silêncio

É o cardeal que vincula seu descarrego com a eleição papal. Seu livro narra que quando a vida de João Paulo II se apagava e o nome de Bergoglio figurava nos prognósticos dos jornalistas especializados, "voltava a se agitar uma denúncia jornalística publicada poucos anos atrás em Buenos Aires" e que, "às vésperas do conclave, que devia escolher o sucessor do Papa polonês, uma cópia de um artigo com a acusação, de uma série do mesmo autor, foi enviada aos endereços de correio eletrônico dos cardeais eleitores com o propósito de prejudicar as chances que eram outorgadas ao purpurado argentino". Bergoglio diz em seu livro que nunca responder à acusação "para não fazer o jogo de ninguém, não porque tivesse algo para esconder". Ele não explica porque mudou agora.

Pastores e lobos

Na realidade, a primeira versão do episódio não se deve a nenhum jornalista, mas sim a Emilio Mignone. Em seu livro "Iglesia y dictadura", editado em 1986, quando Bergoglio não era conhecido fora do mundo eclesiástico, Mignone exemplificou com seu caso "a sinistra cumplicidade" com os militares, que "se encarregaram de cumprir a tarefa suja de limpar o pátio interior da Igreja, com a aquiescência dos prelados".

Segundo o fundador do Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS), durante uma reunião com a Junta Militar em 1976, o então presidente da Conferência Episcopal e vigário castrense, Adolfo Servando Tortolo, concordou que, antes de deter um sacerdote, as Forças Armadas iriam avisar o bispo respectivo. Mignone acrescenta que, "em algumas ocasiões, a luz verde foi dada pelos próprios bispos. No dia 23 de maio de 1976, a Infantaria da Marinha deteve, no bairro de Bajo Flores, o presbítero Orlando Yorio e o manteve durante cinco meses na qualidade de desaparecido. Uma semana antes da detenção, o arcebispo [Juan Carlos] Aramburu havia lhe retirado sua licença ministerial, sem motivo nem explicação. Por diferentes expressões ouvidas por Yorio em sua detenção, fica claro que a Armada interpretou tal decisão e, possivelmente, algumas manifestações críticas de seu provincial jesuíta, Jorge Bergoglio, como uma autorização para proceder contra ele. Sem dúvida, os militares haviam advertido a ambos acerca de sua suposta periculosidade". Mignone se pergunta "o que a história irá dizer sobre esses pastores que entregaram suas ovelhas ao inimigo sem defendê-las nem resgatá-las".

A chaga aberta

Eu publiquei a história nesta mesma coluna, no dia 25 de abril de 1999. Além da opinião de Mignone, a nota incluiu a opinião de quem foi sua colaboradora no CELS, a advogada Alicia Oliveira, que disse o que agora repete no livro: que seu amigo Bergoglio, preocupado com a iminência do golpe, temia pelo destino dos sacerdotes do assentamento e lhes pediu que saíssem dali. Quando foram sequestrados, ele tentou localizá-los e buscar sua liberdade, assim como ajudou os outros perseguidos.

Por causa dessa nota, Orlando Yorio se comunicou comigo do Uruguai, onde vivia. Por telefone e por e-mail, refutou as afirmações de Bergoglio e Oliveira. "Bergoglio não nos avisou do perigo iminente" e "também não tenho nenhum motivo para pensar que ele fez alguma coisa pela nossa liberdade, mas sim todo o contrário", disse.

Os dois sacerdotes "foram libertados pela gestão de Emilio Mignone e a intercessão do Vaticano e não pela atuação de Bergoglio, que foi quem os entregou", acrescentou Angélica Sosa de Mignone, Chela, a esposa durante meio século do fundador do CELS. Seus testemunhos foram incluídos na nota "La llaga abierta", publicada no dia 09 de maio de 1999. Também foram transmitidas ali as posições de Bergoglio e do outro padre sequestrado naquele dia, Francisco Jalics.

Questão de Estilo

Em seu livro, Bergoglio diz agora que Yorio e Jalics "estavam preparando uma congregação religiosa, e lhe entregaram o primeiro rascunho das regras aos bispos Pironio, Zazpe e Serra. Conservo a cópia que me deram". Bergoglio também me entregou uma cópia. Expressa o tipo de dúvidas e de conflitos que foram comuns em um alto número de sacerdotes a partir do Concílio Vaticano II, com "a crise das congregações religiosas, os sinais dos tempos modernos, a coincidência com o sentir da busca dos jovens e a confirmação espiritual que sentimos em nosso modo de viver atual".

O problema, nesse caso, era como compatibilizar "o estilo inaciano da vida religiosa" com "a vida moderna [que] pedia um estilo novo". A ata acrescenta que as Congregações Apostólicas estão organizadas de modo que seus superiores "parecem se ocupar mais com as obras do que pela atenção espiritual de seus súditos". Em troca, eles idealizam o modelo das fundações monásticas e propõem que "a comunidade se una em torno de uma busca espiritual e de um projeto de vida e não em torno de obras". Isso apresenta uma "incompatibilidade pessoal" aos sacerdotes subordinados à disciplina de sua congregação.

Em sua carta ao padre Moura, Yorio menciona essa ata como resposta à pressão de Bergoglio para que dissolvessem a comunidade em Bajo Flores. Acrescenta que deixaram para Pironio, Zazpe e Serra "um esboço de estruturação de vida religiosa em caso de que não pudéssemos continuar na Companhia e fosse possível realizá-la fora", o que não implica que eles quisessem sair dela. Em uma viagem posterior à Argentina, Pironio disse-lhe que não havia consultado o assunto em Roma, porque Bergoglio "havia ido lhe ver para lhe dizer que o padre geral era contrário a nós". Zazpe respondeu que "o provincial andava dizendo que nos tiraria da Companhia", e Serra comunicou-lhe que lhe retirariam a licença na arquidiocese porque Bergoglio havia comunicado "que eu estava saindo da Companhia".

Segundo Bergoglio, o superior jesuíta Pedro Arrupe disse que eles deviam escolher entre a comunidade em que viviam e a Companhia de Jesus. "Como eles persistiram em seu projeto e o grupo se dissolveu, pediram a saída da Companhia". Bergoglio acrescenta que a renúncia de Yorio foi aceita no dia 19 de março de 1976. "Diante dos rumores da iminência do golpe, eu lhes disse que tivessem muito cuidado. Lembro que lhes ofereci, se chegasse a ser conveniente para sua segurança, que viessem viver na casa provincial da Companhia", disse Bergoglio. Afirma também que nunca acreditou que eles estivessem envolvidos em atividades subversivas. "Mas, por causa de sua relação com alguns padres das vilas de emergência, eles ficavam muito expostos à paranoia da caça às bruxas. Como permaneceram no bairro, Yorio e Jalics foram sequestrados durante um rastreamento".

Papeizinhos

Bergoglio também nega ter aconselhado os funcionários de Culto da Chancelaria que rejeitassem a solicitação de renovação do passaporte de Jalics, que ele mesmo apresentou. Segundo Bergoglio, o funcionário que recebeu o pedido lhe perguntou pelas "circunstâncias que precipitaram a saída de Jalics". Ele diz que respondeu: "Ele e seu companheiro são acusados de serem guerrilheiros e não tinham nada a ver".

O cardeal acrescenta que "o autor da denúncia contra mim revisou o arquivo da Secretaria de Culto, e a única coisa que mencionou foi que encontrou um papelzinho daquele funcionário no qual ele havia escrito que eu lhe disse que fossem acusados como guerrilheiros. Eu havia entregue essa parte da conversa, mas não a outra na qual eu lhe indicava que os sacerdotes não tinham nada a ver. Além disso, o autor da denúncia ignora minha carta, na qual eu colocava minha cara por Jalics e fazia o pedido".

Não foi nada disso. Em notas publicadas aqui e em meus livros "El Silencio" e "Doble juego", narrei a história completa e publiquei todos os documentos, começando pela carta de cuja omissão Bergoglio reclama. Depois, segue a recomendação do funcionário de Culto que o recebeu, Anselmo Orcoyen: "Em atenção aos antecedentes do requerente, esta Direção Nacional é da opinião de que não deve aceder".

O terceiro documento é o definitório. Esse papelzinho, assinado por Orcoyen, diz que Jalics tinha atividade dissolvente em comunidades religiosas femininas e conflitos de obediência, que esteve com Yorio na ESMA (detido, diz, em vez de sequestrado) por "suspeito contato com guerrilheiros". O ponto mais interessante é o seguinte, porque remete a intimidades da Companhia de Jesus, vistas a partir da ótica de Bergoglio, que não tinha nenhuma necessidade de confiar ao funcionário da ditadura: "Viviam em uma pequena comunidade que o Superior Jesuíta dissolveu em fevereiro de 1976 e se negaram a obedecer solicitando a saída da Companhia em 19/03".

Ele acrescenta que Yorio foi expulso da Companhia e que "nenhum bispo da Grande Buenos Aires quis lhe receber". A "Nota Bene" final é inegável: Orcoyen diz que esses dados lhe foram repassados "pelo padre Jorge Mario Bergoglio, firmante da nota, com especial recomendação de que não se fizesse o que é solicitado".

(não duvido nada que Bergoglio seja eleito Papa - ele tem o perfil ideal para o cargo)

4 comentários:

  1. Que história! Inegavelmente ele é um conservador. Resta saber se essas acusações todas são verdadeiras. Possivelmente, diante da ditadura argentina, ele agiu como Pio XII diante do nazismo: não o atacou nem o defendeu publicamente, mas simpatizava com o regime no seu interior. Da mesma forma que Pi0 XII via no nazismo um antídoto contra o comunismo, Bergoglio via na ditadura argentina um antídoto contra o mesmo comunismo. Pio XII poderia ter denuncia e excomungado os nazistas, a maioria católicos, mas nunca o fez. Bergoglio também poderia ter denunciado e excomungados o os militares carrascos e torturadores, mas nunca o fez.

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  2. Não me atrevo afirmar se verdade ou não. Toda e qualquer acusação tem fundamento quando requerida a defesa, seja do acusado ou seu representante. Quando apenas uma das partes se manifesta, resta-nos tirar as conclusões de forma unilateral, entretanto, existe uma máxima em direito que diz: "na dúvida, pró réu".
    No Brasil, por exemplo, os homens de luta de esquerda estão solapando a todos como moralistas e homens de bem, estão se locupletando "por não existirem provas"... Muitos dos quais até o STF já declarou inocência...E lá vou eu me preocupar com o que aconteceu na Argentina?? Não temos moral para tal empreitada...

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